Primeiro falou Sócrates, numa entrevista em que pouco disse e em que fugiu às perguntas mais embaraçosas. O que houve a reter é que finalmente, tarde demais e perante as evidências, reconheceu que "tudo aponta para um cenário cada vez mais provável de entrarmos em recessão". Depois, 24 horas mais tarde, ouvimos Constâncio, na conferência de imprensa que convocou, confirmar que realmente os dados provisórios da 4.º trimestre de 2008 apontavam para um crescimento negativo e que portanto estávamos em recessão, juntando ainda a previsão de esta se prolongar pelo presente ano com um crescimento anual fortemente negativo. Fiquei na dúvida se estavam combinados. Parece-me mais provável que Constâncio tenha dito que não lhe era possível calar a grave situação económica do país e que sabendo-o Sócrates decidisse que teria de se adiantar e reconhecer a recessão (classificando-a de apenas provável) que iria ser declarada publicamente. Mas eis que logo a seguir à conferência de imprensa o ministro Teixeira dos Santos chama os jornalistas ao ministério para, de pé, em poucos minutos lhes dizer apenas, sem se referir às declarações de Constâncio, que a prioridade do Governo passa por assegurar o emprego e que o Executivo respondeu atempadamente à crise. Estas declarações causaram algum espanto: "atempadamente"?? Quando só na véspera a probabilidade de recessão tinha sido admitida? Quando o Orçamento de Estado tinha como cenário base uma situação completamente distinta?
Mas o que mais me impressionou foi o aspecto do ministro, com a fala entrecortada, a engolir frequentemente em seco, parecendo mesmo ter lágrimas nos olhos. Estaria comovido? Teria sido pressionado por Sócrates para fazer esta declaração para mostrar que a recessão anunciada por Constâncio não o tinha apanhado desprevenido? Ou, como alvitrou um comentário ao blog Quarta República, seria raiva por Constâncio ter actuado contra o que pretendia o Governo?